segunda-feira, 28 de abril de 2014

Vídeoaula do professor Carlos Nougué sobre crase


Já está disponível na página Questões Gramaticais a videoaula do professor Carlos Nougué sobre crase.

Imperdível!

Para acessá-la, clique aqui

Quando a vírgula faz toda a diferença



Se você é daqueles glutões que vive comendo as vírgulas e acredita que esse sinalzinho não muda o sentido do texto, veja alguns casos em que a vírgula faz toda a diferença:



“Não sou casado.”

“Não, sou casado.”



“Se o homem soubesse o valor que tem a mulher, andaria de quatro à sua procura.”

“Se o homem soubesse o valor que tem, a mulher andaria de quatro à sua procura.”



“Aceito, obrigado.”

“Aceito obrigado.”



“Custa 24,5”

“Custa 2,45”



“Você viu o padre Pedro?”

“Você viu o padre, Pedro?”



“Não quero saber”

“Não, quero saber”



“Se os jurados condenam, eu não absolvo.”

“Se os jurados condenam eu não, absolvo.”




E agora uma boa história para entender como a vírgula é importante:

Um homem rico estava muito mal, agonizando. Dono de uma grande fortuna, não teve tempo de fazer o seu testamento. Lembrou, nos momentos finais, que precisava fazer isso. Pediu, então, papel e caneta. Só que, com a ansiedade em que estava para deixar tudo resolvido, acabou complicando ainda mais a situação, pois deixou um testamento sem nenhuma pontuação. Escreveu assim:

'Deixo meus bens a minha irmã não a meu sobrinho jamais será paga a conta do padeiro nada dou aos pobres.'


Morreu, antes de fazer a pontuação.

Cada um dos concorrentes à herança pontuou o texto da forma que lhe pareceu mais oportuna.


O primeiro a chegar foi o sobrinho:
Deixo meus bens à minha irmã? Não! A meu sobrinho. Jamais será paga a conta do padeiro. Nada dou aos pobres.

A seguir, veio a irmã:
Deixo meus bens à minha irmã. Não a meu sobrinho. Jamais será paga a conta do padeiro. Nada dou aos pobres.

O padeiro puxou a brasa para sua sardinha:
Deixo meus bens à minha irmã? Não! A meu sobrinho? Jamais! Será paga a conta do padeiro. Nada dou aos pobres.

Finalmente, chegaram os pobres da cidade, que fizeram a seguinte pontuação:
Deixo meus bens à minha irmã? Não! A meu sobrinho? Jamais ! Será paga a conta do padeiro? Nada! Dou aos pobres.

sábado, 26 de abril de 2014

Entrevista com a tradutora Simone Vieira Resende

Simone Vieira Resende é tradutora, nasceu em Teresópolis, interior do Rio de Janeiro. É graduada em letras e mestre em Linguística pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ, onde também leciona Língua Inglesa.


Diana - Quais são as línguas que você traduz e há quanto tempo é tradutora?
Simone -  Eu sou tradutora há mais de 15 anos e traduzo do inglês para o português e do português para o inglês.

Diana - Como foi que começou a trabalhar como tradutora técnica?
Simone -  Comecei fazendo versões de RESUMOS para meus amigos.

Diana - Quais foram os principais desafios no início da carreira?
Simone – O maior desafio foi entender que eu não precisava escolher entre ser PROFESSORA e TRADUTORA. Eu poderia ser os dois. Demorei muito para aceitar e entender isso. Vivia em um limbo achando que nunca iria ganhar dinheiro com nenhuma das duas profissões e que estava fadada ao fracasso. Ledo engano!

Diana – Em sua opinião, quais são os conhecimentos e as qualidades que essa modalidade requer?
Simone – Não apenas a tradução de especialidade, mas a tradução de uma forma geral exige do tradutor uma eterna desconfiança que aquilo pode não ser exatamente o que ele acha que é. Essa desconfiança faz o tradutor pesquisar e quem pesquisa tem mais chance de acertar. O tradutor deve cultivar a desconfiança em todos os momentos. Outra qualidade que considero fundamental para um tradutor é sua capacidade de fazer e manter seus contatos. Me refiro aos amigos e especialistas de diferentes áreas, aqueles que servem de subsídios externos para um trabalho e também de apoio moral quando as coisas se complicam. O ofício do tradutor não é nem de longe um trabalho solitário.

Diana - Quais são as suas especialidades?
Simone – O gênero que mais traduzo são os artigos científicos das mais diversas áreas de especialidade. Faço muitas versões para o inglês de texto de agronomia, engenharia, saúde, arquitetura, cinema, história e finanças. No ano de 2013 eu comecei a me aventurar no caminho da tradução literária e junto com dois amigos traduzi um romance e um livro sobre comportamento. Gostei desse glamour que envolve a tradução de literatura e pretendo continuar.

Diana - Em sua opinião, porque a tradução técnica é uma das modalidades mais bem remuneradas na área de tradução?
Simone – Na verdade a demanda por tradução técnica é sempre muito grande e no momento que você se especializa em um determinado gênero e algumas áreas, você se torna conhecido, seu trabalho passa a ser apreciado e quando você se valoriza e se esforça para manter a qualidade da sua produção é inevitável que a remuneração seja alta e você comece a ganhar dinheiro com isso. Quando falo sobre esforço, me refiro a você acreditar no seu potencial, acreditar na abundância e não se deixar levar pelo culto da pobreza. Não devemos acreditar em competição. Há espaço e trabalho para todos. Devemos acreditar no estudo, na leitura e na valorização dos detalhes de um projeto de tradução. Esse é o diferencial que faz com seu trabalho possa ser bem remunerado. Você deve ser o primeiro a valorizá-lo.

Diana - O que pesa mais: o conhecimento técnico ou o conhecimento linguístico?
Simone – Na hora da tradução o importante é saber equilibrar os dois conhecimentos ou a falta de um deles! Você pode saber escrever bem na língua de chegada, mas se não dominar a terminologia daquela área vai causar estranheza no seu público alvo. Para sanar isso, é importante ter amigos. Os contatos com especialistas das áreas para qual você traduz é fundamental para o sucesso do seu trabalho. Não basta curtir as fotos nas redes sociais, é preciso ter consideração genuína pela amizade, para só então poder ligar às 3 da manhã e perguntar sobre o uso de algum termo técnico! 


Diana - Do que mais gosta em seu trabalho?
Simone – Eu gosto de tudo. Adoro poder ficar em casa no computador. Amo poder traduzir de qualquer lugar que estiver e adoro participar de tradução em conjunto, como tradução de jogos, tradução com quatro ou seis mãos em um mesmo texto. A tradução me fascina, esse leva e traz de informação entre culturas diferentes preenche em mim a necessidade de me sentir parte do mundo e livre ao mesmo tempo. Como também sou professora de tradução, eu acho que consegui juntar as duas coisas que mais amo fazer: traduzir e ensinar. Acredito que cada aluno que chega para mim é uma nova oportunidade, um novo desafio e uma nova história para ser escrita, não quero nunca parar de lecionar.


Diana – Em suas aulas de terminologia, você sempre frisou a importância do glossário e do corpus para a tradução. De que forma essas ferramentas contribuem para o trabalho do tradutor?
Simone – Seja sozinho, em dupla ou em um grupo, o tradutor não pode confiar em sua memória. Na verdade, ninguém pode. É fundamental que toda sua pesquisa seja registrada. Quando você registra o termo que escolheu em um glossário, você ganha mais tempo e dá qualidade para sua tradução. A tradução fica uniforme, coerente e as escolhas podem ser repetidas ao longo do texto sem que uma nova pesquisa precise ser feita. Daí, sobra tempo. Tempo pra ser feliz, caminhar na praia e curtir os amigos. A tecnologia, as ferramentas de memória, as pesquisas em corpora vieram para ajudar, facilitar e melhorar o trabalho tradutório.

Diana – Você demonstra ser adepta da tecnologia, de que forma podemos melhorar nosso trabalho com o uso de recursos tecnológicos?
Simone – Cada novo software lançado no mercado cria hoje uma legião de excluídos. Não há como acompanhar todas as novidades do mercado. Contudo, não basta usar o simples editor de texto como se fosse uma máquina de escrever. A tecnologia de nada serve quando não se curva aos nossos desejos. Ela deve nos servir e não o contrário. Eu sou fã das ferramentas de memória, da tradução automática e de tudo que pode fazer meu trabalho mais simples e com mais qualidade. Não acredito que a máquina poderá substituir o trabalho do tradutor, mas sim auxiliar para que o trabalho possa ser agilizado, melhorado e que sobre tempo para investir nas relações pessoais, na felicidade!

Diana – O que faz para recuperar a energia após um trabalho exaustivo?
Simone - Quando termino um longo projeto tradutório gosto de comemorar com uma caminhada na praia junto com um sorriso daqueles “consegui”! Mas, o que me move e me motiva é o PRAZO! Que tradutor não adora uma deadline?
Pensando bem, uma das coisas que mais gosto em ser tradutora é não ter esse compromisso com o fim de semana, férias e nem com as paranoias típicas dos trabalhos de segunda a sexta, das 9 às 5. Para nós tradutores isso não existe. Podemos trabalhar por 12 horas direto em um domingo e depois passar uma segunda a tarde lendo e descansando em uma rede! Entre nós tradutores não há nada do tipo: “Ah, não! Amanhã é segunda-feira!” Todo dia é dia útil e todo dia é dia de descanso!

Diana - Lembra-se de alguma anedota ou gafe que possa compartilhar?
Simone – Me lembro que uma vez, alguns anos atrás, eu dei uma entrevista para um programa de televisão sobre meu trabalho. Era um programa esotérico que queria entrevistar uma tradutora/professora do signo de sagitário. Eu topei. A equipe do programa queria me filmar trabalhando como tradutora e me perguntaram como era o dia a dia de traduzir com frequência. Eu descrevi a cena, dizendo que era eu, em casa, cabelo pra cima, pantufas, xícara de café na mão. A equipe então me pediu que a cena não fosse tão real. “Vamos fazer uma cena mais fake, você arrumada, sentada em um café em Ipanema traduzindo. Que tal?” Eu tomei, né? Afinal, não seria tão falso assim.
Você pode assistir aqui: http://youtu.be/8EMmubD_2yE


Diana – Que recomendações gostaria de deixar para aqueles que desejam iniciar na profissão?
Simone – É preciso estudar para ser tradutor. Não basta saber uma segunda língua. Você tem de saber bem a sua língua e a do outro. Minha recomendação é que se você quer ser tradutor procure um curso de formação e estude. Pode ser um curso técnico, uma pós-graduação, uma oficina, uma graduação, qualquer coisa. Estude. Não tenha medo de errar. Tente, erre, acerte, erre e comece de novo. Se o seu sonho é ser tradutor, invista e não desista. Respire, sorria e determine ser feliz agora.




Trabalhos de Simone Vieira Resende:







sexta-feira, 25 de abril de 2014

A tradução de textos publicitários



A tradução de textos publicitários muitas vezes ultrapassa o trabalho de busca de correspondentes de uma língua para outra e as campanhas publicitárias são praticamente recriadas para ser lançadas em outros países. Em muitas ocasiões o tradutor trabalha em conjunto com a agência de publicidade e o resultado é drasticamente diferente do original.



Esse tipo de tradução é chamado de tradução criativa e deve levar em conta os hábitos, crenças, costumes e preferências do público-alvo para que este se identifique com o produto que está sendo oferecido.



A empresa sul-coreana Samsung, por exemplo, lançou uma campanha publicitária na Argentina chamada “Nuestro idioma es el fútbol”. A escolha do tema não podia ser mais acertada, já que o futebol é a paixão nacional dos argentinos; se o público-alvo fosse o norte-americano, provavelmente o esporte escolhido seria o beisebol. O lema da campanha “Amás el fútbol, amás Argentina” também busca identificação com o público ao empregar a forma verbal que concorda com o pronome pessoal “vos”, fenômeno linguístico conhecido como voseo e típico do espanhol rio-platense. O tema da campanha foi a linguajem do futebol, as expressões idiomáticas ligadas ao esporte tais como colgar los botines”, “dar bola”, “dejarla picando”, “embarrar la cancha, etc.



Não sei se se trata de lenda urbana, mas segundo informações disponíveis na rede, eis alguns dos erros que ficaram famosos na tradução publicitária:



Quando a empresa Parker lançou no mercado mexicano uma caneta com sistema antivazamento a frase “No goteará en su bolsillo ni lo dejará embarazado” foi resultado de uma má tradução do inglês "it won’t leak in your pocket and embarrass you" (não vaza no seu bolso e te envergonha). Assim, a tradução correta seria “No goteará en su bolsillo ni le pondrá en un aprieto”.



O slogan de uma das campanhas da Pepsi nos Estados Unidos foi "We bring you back to life" (trazemos você de volta à vida), o que foi traduzido ao mandarim como “Trazemos seus ancestrais de volta à vida".


A Kentucky Fried Chicken teve problemas ao abrir seu primeiro restaurante em Pequim quando o famoso slogan da marca, "It’s finger lickin’ good!" (bom de lamber os dedos), foi traduzido na capital chinesa como "Vamos comer seus dedos!".


Quando a American Airlines quis promover os novos assentos de couro da primeira classe no mercado mexicano, traduziu literalmente a mensagem da campanha 'Fly in leather' por 'Vuela en cuero', que em espanhol significa ‘voe pelado’.

terça-feira, 22 de abril de 2014

Tradução para o português de um conto de Camilo José Cela



Obra de Mark Barone do projeto "An Act of Dog"


Pequena parábola de “Chindo” cão de cego
Camilo José Cela 
Título original: Pequeña parábola de "Chindo" perro de ciego
Tradução: Diana Margarita
 
“Chindo” é um cãozinho vira-lata e de nobres sentimentos. É pitoco e sua pele não tem brilho, de pequeno porte e orelhas flácidas. “Chindo” é um cão abandonado e sentimental, arbitrário e carinhoso, malandro forjado, vagabundo e adorável, como os pardais-cinzentos da cidade. “Chindo” tem o ar, entre alegre e inconsciente, das crianças pobres, das crianças que vagam sem rumo fixo, olhando para o chão em busca da moeda que alguém, certamente, deve ter perdido.

“Chindo”, como todas as criaturas do Senhor, vive do que cai do céu, que às vezes é um pão duro, em ocasiões uma pelanca de carne, de vez em quando um esquecido resto de salame, e sempre, graças a Deus, um sorriso que somente “Chindo” vê.

“Chindo”, com a consciência tranquila e o olhar adolescente, é cão entendido em homens cegos, sábio nas difíceis artes de guia, companheiro leal na desgraça e na escuridão, nas trevas e no andar sem fim, sem objeto e com resignação.

O primeiro amo de “Chindo”, sendo “Chindo” um cão, foi um autor de coplas barbudo e sem olhos, andarilho e trovador, que se chamava Josep, e era, segundo dizia, do casario de Soley Avall, em San Juan de las Abadesas e às margens de um rio Ter ainda jovem.

Josep, com seu porte de capitão em desgraça, passou a vida cantando por Ampurdán e Cerdaña, com sua voz de barítono montanhesco, um romance andeiro que começava dizendo:

            Si t´agrada córrer mon,
            algun dia, sense pressa,
            emprèn la llarga travessa
            de Ribes a Camprodon,
            passant per Caralps i Núria,
            per Nou Creus, per Ull de Ter
            i Setcases, el primer
            llogaret de la planúria.

“Chindo”, ao lado de Josep, conheceu o mundo das montanhas e da água que cai rolando pelo penhasco, rugidora como o diabo preso aos arbustos e fria como a mão das virgens mortas. “Chindo”, sem se afastar de seu amo mendigo e errante, soube do sol e da chuva, aprendeu o canto das cotovias e da minúscula alvéola-branca, instruiu-se nas artes do verso e da orientação e viveu feliz durante toda sua juventude.

Mas um dia… Como nas fábulas desgraçadas, um dia Josep, que era já muito velho, dormiu e não acordou mais. Foi na Font de Sant Gil, a que está debaixo de uma gentil capela.

“Chindo” uivou com a dor dos cães sem amo cego a quem guardar, e as montanhas lhe devolveram seu frio e desconsolado uivo. Na manhã seguinte, uns homens levaram o cadáver de Josep em cima de um burro manso e cinzento, e “Chindo”, para o qual ninguém dirigiu o olhar, chorou sua solidão em meio ao campo, a história - a eterna historia dos dois amigos Josep e “Chindo” – ficava para trás e à sua frente, como em mar aberto, um caminho largo e misterioso.

Quanto tempo andou à toa “Chindo”, o cão solitário, de Seo a Figueras, sem amo a quem servir, nem amigo a quem escutar, nem cego a quem atravessar as pontes como um anjo? “Chindo” contava o trânsito das estações no relógio das árvores e evidentemente envelhecia - onze anos já! – sem que Deus lhe desse a companhia que procurava.

Tentou viver entre os homens com olhos no rosto, mas logo percebeu que os homens com olhos no rosto olhavam atravessado, sinistramente, e não tinham sossego no olhar da alma. Tentou deambular, como um cão vagabundo e sem princípios, pelas pracinhas e pelas ruelas dos povoados grandes - dos povoados com um registro civil, duas drogarias e sete açougues – e sem se deter viu que, nos povoados grandes, cem cães disputavam a dentadas o desmedrado osso da caridade. Tentou lançar-se ao campo, como um bandoleiro dos tempos antigos, como um José María «el Tempranillo», a pé e em forma de cão, mas o campo imprimiu cunho em seu medo, na primeira noite, e o devolveu ao casario com os sustos grudados à espinha, como carícias que não se esquecem.

“Chindo”, com fome e sem consolo, sentou-se à beira da estrada esperando que a marcha do mundo o empurrasse para onde quisesse, e, como estava cansado, adormeceu ao pé de uma espinheira carregada de bolinhas vermelhas e brilhantes como se fossem de vidro.

Por um sendeiro pintado de azul desciam três meninas cegas com a cabeça enfeitada com a pálida flor do peral. Uma menina se chamava Maria, a outra Nuria e a outra Montserrat. Como era verão e o sol aquecia o ar de respirar, as meninas cegas vestiam roupas de seda, muito endomingadas, e cantavam canções com uma vozinha amável e de guizo.

“Chindo”, quando as viu se aproximarem, quis acordar para lhes dizer:

-Gentis senhoritas, querem que eu vá com vocês para lhes mostrar onde há um degrau, ou onde começa o rio, ou onde está a flor que enfeitará suas cabeças? Meu nome é “Chindo”, estou sem trabalho e, em troca de minhas artes, não peço nada além de um pouco de conversa.

“Chindo” teria falado como um poeta da Idade Média. Mas “Chindo” sentiu um frio repentino. As três meninas cegas que desciam pelo sendeiro pintado de azul foram se apagando atrás de uma nuvem que cobria toda a terra.

“Chindo” já não sentiu frio. Pensou voar, como uma leve ave, e ouviu uma voz amiga que cantava:

            Si t´agrada córrer mon,
            algun dia, sense pressa…

“Chindo”, o cãozinho de sangue ruim e de nobres sentimentos, estava morto ao pé da espinheira de vermelhas e brilhantes bolinhas que pareciam de vidro.


Alguém ouviu tocar pelo céu as ingênuas trombetas dos anjos mais jovens.