quinta-feira, 30 de junho de 2016

Falso amigo: experto - esperto


Em espanhol, assim como em português, temos o adjetivo “experto” com ‘x’ que significa: especialista, perito, que tem larga experiência em determinado assunto.

Por outro lado, em português, temos também o homônimo “esperto” com ‘s’ que significa: inteligente, perspicaz, sagaz, que aprende rápido. Os homônimos são palavras que têm a mesma grafia ou a mesma pronúncia, mas significados diferentes.

Assim, um bebê pode ser “esperto”, porque aprende as coisas rapidamente, mas dificilmente será “experto” em algo, pois não tem vivência suficiente para isso.

Ao traduzir “esperto” para o espanhol, podemos escolher entre: listo, espabilado, inteligente, perspicaz, sagaz, etc. E ao traduzir “experto”, podemos escolher entre: experto, especialista, perito, maestro, etc.

Vejamos alguns exemplos:

“Don Juan” era um especialista na arte da sedução = Don Juan era un experto en el arte de la seducción.

Preciso de um especialista em enxaqueca = Necesito un experto en migraña.

Esse menino é mesmo muito esperto = Ese niño es, sin duda, muy listo/espabilado.

Fique esperto, há muitos fraudadores na rede! = ¡Espabílate, hay muchos estafadores en la red!

segunda-feira, 27 de junho de 2016

Entrevista com a tradutora Lineimar Martins sobre o lançamento de seu livro "Memórias de uma Suburbana 'dura' que decidiu morar na Europa"

Lineimar Martins, autora de "Memórias de uma suburbana
‘dura’ que decidiu morar na Europa

Diana – Olá, Lineimar! Em primeiro lugar quero agradecer sua participação e dizer que é um grande prazer tê-la novamente aqui no blog. Para quem ainda não leu sua entrevista, Lineimar Martins é franco-brasileira, doutora em antropologia, tradutora de francês e escritora. Aliás, foi esta última qualidade que motivou a presente entrevista. Ela acaba de publicar seu livro “Memórias de uma suburbana ‘dura’ que decidiu morar na Europa”. O que a motivou a querer contar essa história?

Lineimar Vários fatores me levaram a escrevê-la. Há alguns anos, recebi o diretor de uma editora brasileira em Lyon, onde morava. Já naquela época ele havia me sugerido escrever sobre minha decisão de largar tudo no Brasil e vir para a Europa, sem dinheiro e sem conhecer ninguém aqui, dizendo que esse assunto poderia interessar a muita gente. Sugeriu também colocar uma pouco de humor, para que ficasse uma leitura leve. Na época, eu não estava muito convicta, na verdade estava no meio dos meus estudos de etnologia, envolvida com outro tipo de escritura, mais acadêmica, mas a ideia ficou. Hoje, passados quase vinte anos dessa conversa, levo uma vida muito diferente. A sugestão dele começou a fazer sentido. Porque me sinto em paz comigo mesma, quis mostrar àqueles que vão ler o livro o quanto é importante ter sonhos, acreditar neles, mesmo que seja necessário colocar toda nossa energia em sua realização, que foi o que fiz vinte e quatro anos atrás. Enfim, uma razão secundária, mas também importante, é contradizer a todos os que subentenderam que tive sorte na vida e mostrar que tudo o que conquistei foi com determinação e trabalho.

Diana - Conte-nos um pouco sobre o processo de “gestação”

LineimarFoi um longo processo. Desde que a crise atingiu a editora com a qual trabalho, o fluxo de minhas traduções diminuiu sensivelmente. Como acho que o tempo é um bem raro e deve ser aproveitado intensamente, comecei a pensar em como usá-lo de um modo produtivo. Lembrei-me dessa conversa com o tal editor. O mais difícil foi achar o tom e o fio condutor da história.  Ouvi outro dia, num programa literário, alguém dizer que toda história merece ser contada, o mais importante é saber contá-la. Como não sou rica, nem famosa, nem fiz nenhuma grande descoberta revolucionária, teria que encontrar um gancho atrativo que envolvesse o leitor. Havia até pensado em escrever como se fosse meu filho contando minha história depois da minha morte, utilizando o ela no lugar do eu. Mas além de macabro... rsrs, o exercício seria mais complicado. Depois me perguntei que momento seria pertinente para começá-la: na infância, na morte da minha mãe, que foi um novo ponto de partida para mim, na chegada aqui... então me lembrei dessa conversa com meu ex-namorado.  Sem eu perceber, ela me marcou, pois lembro exatamente de tudo, até do rosto dele dizendo isso. Foi mesmo um desafio que ele, sem querer, colocou quando duvidou de mim. E como não podia deixar de ser, “antropologizei” a história, contextualizei as situações para dar uma maior densidade e um interesse sociológico com alguns insights sobre questionamentos pessoais, sobre o determinismo social, sobre o quanto o olhar dos outros pode nos influenciar na vida. Depois que encontrei o tom, foi muito rápido.

Diana – Agora que você já falou da “gestação”, diga-nos como foi o “parto”? ...rss  Foi difícil trazer a obra à luz, publicá-la?

Lineimar Primeiramente, devo admitir publicamente meu mais grave defeito: sou impaciente. Fiz uma carta que enviei a algumas editoras, personalizadas, enviando uma a uma com o nome do responsável pela edição. Como as respostas foram negativas, algumas me dizendo para voltar a contatá-los em dois anos!, decidi usar a autoedição mais uma vez. Já havia publicado um livro assim. É interessante. Meu objetivo é fazer coisas na vida, usar meu cérebro, não concebo ficar de braços cruzados e já não tenho tanta necessidade de reconhecimento. Por isso, a autoedição me convém. Concretizei um projeto, comecei a divulgá-lo, se agradar às pessoas melhor ainda, pois o objetivo é compartilhar o conhecimento, saberes. Mas o essencial foi ter usado meu tempo ocioso fazendo alguma coisa rica e interessante. Nessa forma de publicação somos nós, os autores, que fazemos tudo: a paginação, a capa, decidimos o tamanho etc. É a parte prazerosa do projeto, quando o que esteve durante meses em nossa mente se materializa. A partir de agora, o que vier é lucro.

Diana – Continuando com a metáfora da maternidade, em algum momento o filho tornou-se rebelde, fugiu do controle? Acredito que a escrita, principalmente a autobiográfica, é um exercício revelador que em algum momento pode nos surpreender e trazer à tona coisas que não esperávamos. É isso mesmo?

Lineimar Não sei se considero ter fugido do controle, mas teve um capítulo inteiro no qual falava de meu pai que retirei do livro. Por que era extremamente íntimo e não dizia respeito somente a mim. Acho a história da família dele fantástica, tipicamente brasileira, mas falar da saga familiar envolveria também meus primos, meus tios, irmãos, e não sei se todos estariam dispostos a ter sua história familiar estampada em um livro, publicamente. Teria sido impudente demais.

Diana – “Mulher”, “suburbana”, “dura”, você não deixou que esses rótulos se interpusessem em seu caminho atrás de um sonho. De onde veio tanta obstinação e persistência?

Lineimar Alguma coisa dentro de mim nunca aceitou certas coisas, como o machismo, a discriminação ou a injustiça social. Não sei de onde vem isso, mas nunca consegui conceber que certas coisas devessem ser exclusivas aos que nasceram em berço de ouro, ou com outro sexo, ou em outro país. Não sou fatalista, ao contrário, acredito em nosso poder interno. Também não sou materialista e não ligo para o luxo, mas acho que a cultura deveria ser um direito de todos. E sempre corri atrás dela. Além disso, já fui militante política, já trabalhei no humanitário, tentando reparar um pouco dessas injustiças, mas tive a impressão de dar murro em ponta de faca. Então agi e ajo no meu âmbito pessoal para tentar mudar pelo menos a visão das coisas, que é o que está a meu alcance na vida e na profissão que escolhi.

Diana – O que você diria àqueles que sonham com uma vida nova em outro país, mas não tem recursos financeiros? Você acha que daria para repetir sua façanha nos dias atuais?

LineimarPois é, acho que hoje o mundo não é mais o mesmo. Algumas coisas estão muito mais fáceis, com internet e a democratização dos preços de passagens aéreas, mas outras mais complicadas por causa do terrorismo e do aumento da xenofobia e do racismo no mundo. A Europa está vivendo uma grande contradição ou mesmo uma retrogradação, pois estava caminhando para a abertura das fronteiras com a criação da Comunidade Europeia e o espaço Schengen, mas hoje muitos países que constituem a Comunidade Europeia estão apresentando programas retrógrados com tendência ao fechamento das fronteiras. O Reino Unido acaba de votar por uma saída da Comunidade, outros países como a Grécia já levantaram essa questão. E nos Estados Unidos existe a possibilidade de eleição de um homem abertamente racista e xenófobo como o Donald Trump. Isso tudo atinge o modo como esses países recebem e tratam seus imigrantes. Mas felizmente o mundo não se resume à Europa e aos Estados Unidos, muitos países estão abrindo as portas para estrangeiros, de acordo com suas necessidades de mão de obra, como o Canadá e talvez países asiáticos ou africanos. Não recomendaria fazer como eu fiz, lançar-se assim, na lata, como dizemos no Rio, mas realmente preparar um projeto, aprender o idioma, trabalhar para juntar dinheiro, se informar sobre as leis imigratórias e até fazer uma formação na área carente de mão de obra, por exemplo. Sei que aqui na França, apesar de um altíssimo desemprego, algumas ofertas de emprego não encontram mão de obra, como para servir e lavar louça em restaurantes, cuidados com pessoas idosas. Estão também precisando muito de médicos para morar em pequenas cidades. Já li que algumas cidades oferecem consultório montado para médicos que se disponibilizariam em morar ali. Mas o que é muito importante saber antes de se lançar, é que a probabilidade de descer na pirâmide social é muito grande, quando se emigra para outro país. Eu mesma deixei um cargo de Assistente de Merchandising para fazer faxina e cuidar de crianças. Deve-se ter consciência disso, porque nem sempre é fácil para a autoestima.

Diana – O que os leitores podem esperar de seu livro?

LineimarAcho que uma das coisas positivas que eles podem encontrar nesse livro é o acompanhamento da realização de um projeto que começou do nada e foi tomando forma. Tentei transmitir o processo mental que me motivou a fazê-lo, embora não tenha certeza de ter conseguido. E, evidentemente, o processo material que foi o que desbloqueou na prática todo o resto. Quis mostrar o valor do trabalho, da determinação, da fé em si mesmo. Detesto certa mentalidade de hoje que supervaloriza o dinheiro fácil, a celebridade, o materialismo predominante. Além desse aspecto, os que nunca estiveram na Europa vão aprender um pouquinho sobre alguns países que compõem esse continente, através do meu olhar, é claro, fora dos roteiros turísticos, o olhar de alguém apaixonado pela vida e pelas belas coisas que o mundo tem para mostrar em termos de patrimônio e cultura. Mesmo hoje, quando passeio pela Europa, fico deslumbrada com a beleza e organização deste lugar.

Diana – Para terminar, você está traduzindo seu livro para o francês, como é a experiência de traduzir o próprio livro?

Lineimar - Na verdade vai além de uma tradução. Estou adaptando o texto para o leitor europeu. O posicionamento é totalmente diferente, porque acho que ele não tem ideia do que a Europa representa para a gente, do outro lado do Atlântico. Estou focalizando nas particularidades do Brasil, tem uma ênfase mais sociológica, principalmente quando falo dos anos 1970 aos 1990 quando deixei o país, a ditadura militar e o que tudo isso representava para minha geração, nascida com o golpe de 1964. Enfatizo a questão dos preconceitos contra os suburbanos que, na minha opinião, é muito forte na cidade do Rio de Janeiro. Fiz uma tradução do texto quase literal para usá-la como esqueleto do texto francês, e agora vou transformá-la, deixá-la mais fluida. É claro que, mais ainda que para a versão em português, que você inclusive tornou melhor com suas sugestões, vou precisar de um revisor francófono para corrigi-la. Depois, passará pela crítica exigente do meu marido. 



Disponível para venda no Clube de Autores e na Amazon.

sexta-feira, 24 de junho de 2016

“Refanfinflársela algo a alguien”, significado


O verbo “refanfinflar” é uma criação expressiva utilizada na Espanha, tem sua origem na oralidade popular, na coloquialidade. É uma forma de dizer que está “pouco se lixando” ou "que está se danando" para algo ou para alguém, ou seja, que não lhe dá a mínima importância.

Refanfinflársela algo a alguien” é uma locução verbal vulgar, malsoante, equivale a expressões como “traerle sin cuidado, importarle un bledo, un pepino, un pito”. E o pronome la de tal construção se refere ao órgão reprodutor masculino (la polla, denominação vulgar), de acordo com o modelo estabelecido por outras expressões paralelas, e ainda mais vulgares,  sudásela/soplársela/pelársela a alguien e traérsela (floja, pendulona) a alguien. Emprega-se da seguinte forma:

Me la renfanfinfla cualquier problema suyo.

Izco: "Lo que diga Mourinho me la refanfinfla" (declaração do jogador Izco do Real Madrid sobre o técnico, com respeito ao encontro natalino com a mídia, http://www.resultados-futbol.com/noticia/izco-lo-que-diga-mourinho-me-refanfinfla)

Ricardo Rousselot: «El Premio Nacional de Diseño me la refanfinfla» (declaração do considerado “mestre da caligrafia” sobre o prêmio nacional de desenho, http://graffica.info/rousselot-el-premio-nacional-de-diseno-me-la-refanfinfla/)

Essa criação expressiva, por sua vez, já deu origem a uma nova variante, “repampinflar”, como registra o artigo “Refanfinflar, repampinflar”, de Pedro Álvarez de Miranda, publicado na revista Rinconete do Centro Virtual Cervantes. “En una entrevista periodística a Rosa Díez me topo con un bien curioso verbo: «Hay quien dice que somos de la extrema derecha y quien dice que somos de la extrema izquierda; nos la repampinfla el adjetivo» (El País, 25 de mayo de 2013). Me refiero, naturalmente, a ese repampinflar, que me ha llevado a indagar, por vía de ejemplo, en la alta variabilidad de las llamadas «creaciones expresivas».

Nesse interessante artigo, o autor se indaga sobre o que origina esse tipo de criações expressivas, como se cristalizam e como surgem outras variantes. Para ler o artigo na íntegra, acesse

A origem dessa expressão é desconhecida, mas pode ser vista como uma “jitanjáfora”, texto carente de sentido cujo valor estético se baseia na sonoridade e no poder evocativo das palavras, reais ou inventadas que o compõem.  A palavra “jitanjáfora”, por sua vez, foi usada pelo poeta cubano, M.Brull (1891-1956) para finalizar o terceiro verso de um poema que, repleto de vozes sem significado, mas de grande sonoridade. Posteriormente, o humanista Alfonso Reyes (1889-1959) a usaria para designar esse tipo de enunciados.

dle.rae.es
cvc.cervantes.es
http://blogs.lavozdegalicia.es/

quarta-feira, 22 de junho de 2016

'Se' acidental em espanhol

Imagens extraídas do Pinterest

Em espanhol, há uma construção bastante peculiar que consiste no emprego do pronome “se” + dativo possessivo (objeto indireto) para indicar uma ação acidental ou involuntária. 

O pronome “se” acidental revela que a ação realizada não é intencional, mas sim acidental ou involuntária. O pronome “se”, neste tipo de construção é invariável para todas os pronomes pessoais (yo, tú, él, ella, etc.) e é seguido pelo dativo (pronome indireto) que mostra quem é afetado pela ação verbal.

Esse pronome indireto, dativo, pode referir-se a:

a)    O possuidor do objeto (Se me cae el libro – o livro é meu ou está comigo).
b)   Agente involuntário da ação (Se le olvidó la tarea – é ‘ele’ quem não se lembrou da tarefa).
c)    A pessoa que recebe as consequências da ação (Se me cayó el café encima – eu fui atingido pelo café derramado).

Também é possível duplicar o pronome indireto:

A mí se me cae el libro.
A él se le olvidó la tarea.
A mí se me cayó el café encima.

A presença do pronome “se” nas frases acima serve para enfatizar a não intenção de que a ação ocorresse.

Para entender melhor essa estrutura, vejamos alguns exemplos práticos:

Se me quemó la comida.

Se nos olvidó tu cumpleaños.

A ti se te ensució la camisa.

A los vecinos se les estropeó el coche.

Se le cayó el pelo.

Se nos hizo agua la boca al ver el postre.

Al abuelo se le ha roto el fémur.

Se me "chispoteó" (a correta é "se me chispó" que no México significa "escapuliu", quando alguém faz algo sem querer. A frase dita pelo Chaves é uma versão modificada para soar mais engraçada).

Durante el entrenamiento, debido a una falta no pitada, a Messi se le cruzaron los cables con Luis Enrique (cruzársele los cables a alguien = perder momentáneamente el juicio).

Revista redELE - Red Electrónica de Didáctica del Español como Lengua Extranjera
http://www.mecd.gob.es/redele/revistaRedEle.html

segunda-feira, 20 de junho de 2016

Usos excepcionais do hífen com prefixos em espanhol


Em espanhol, como regra geral, o prefixo se une à base sem hífen, exceto quando: a segunda palavra começar com maiúscula, for um número ou um nome (anti-OTAN, sub-16, pro-Obama).

No entanto, pode-se escrever, em caráter excepcional, com hífen quando:

1) for preciso para entender um derivado, ou seja, com caráter diacrítico: ex-preso (ex-presidiário), expreso (trem, tipo de café);

2) em obras que priorizem a criatividade ou la vontade de estilo (re-presentar, presentar novamente), ou

3) para enfatizar o valor semântico do prefixo (pre-texto ‘texto prévio’, pre-hecho 'fato prévio).

Para ver as regras de uso dos prefixos em espanhol, clique aqui.

Para saber sobre a coordenação de prefixos, clique aqui.

www.fundeu.es

quarta-feira, 15 de junho de 2016

Significado e uso da expressão "fiarse de", em espanhol



O verbo fiar, em espanhol, significa garantir, assegurar, afiançar  (“Cuando te pagan con la tarjeta de débito, fías a tu banco”), ou ainda, entregar algo aos cuidados de alguém (“fiar un secreto a alguien/le he fiado a la suerte mi destino”). Também significa vender a crédito (“con la crisis actual ya no puedo fiar más”). A expressão “al fiado” também existe em espanhol, mas não é muito comum, refere-se ao ato de comprar ou vender a crédito, em confiança (“En algunos pueblos, en las pequeñas tiendas del barrio, aún se puede comprar al fiado”) à significa comprar. Provém do latim fidere (dar fé).

A expressão fiarse de significa confiar em algo ou em alguém e usa-se normalmente como intransitivo pronominal, acompanhado de complemento introduzido pela preposição de (Yo me fío de, tú te fías de, vos te fiás de, él/ella se fía de, nosotros nos fiamos de, vosotros os fiais de, ustedes se fían de, ellos/ellas se fían de).

Exemplos de uso:

“Eres muy peligroso y no me fío de ti” (ASantos Vis, 1992).

“(...) los bulos lingüísticos que hemos oído mil veces y de los que no conviene fiarse” (Fundéu reúne en un «compendio deleitoso» consejos y curiosidades del español, www.fundeu.es).

Cuando uno dice que ‘ya le ha mordido el perro’, significa que ya está escarmentado; es decir, que no se fía de algo por el hecho de haberle ocurrido un acontecimiento similar del que salió malparado  (A mí no me pidas más dinero, que ya me ha mordido el perro)”.

No te puedes fiar de todo lo que encuentras en internet. Tampoco te fíes de los precios demasiado bajos”.

De la mala mujer no te guíes, y de la buena no te fíes”. (Provérbio)

 “¿Podemos fiarnos de las etiquetas orgânicas?”.

Mi vecino es de fiar”, “¿Cómo sé si mi banco es de fiar?” (“ser de fiar” locução que significa “ser merecedor de confiança”).

Seu uso como intransitivo não pronominal é dialetal ou literário, e o complemento pode vir introduzido pelas preposições de ou en:

“No fiaba de más ojo que el suyo” (Nácher Guanche, 1957).

“Fía en mí, que en poco meto en tu bolsa lo que te adeudo” (Lázaro Humo, 1986).

Diccionario panhispánico de dudas
dle.rae.es
fundeu.es

terça-feira, 14 de junho de 2016

Como aprendi o português


Acho que o que mais me atrai na tradução é o intercâmbio cultural, a possibilidade de transportar para outra língua outro modo de pensar, de ver o mundo. Estou lendo o livro “Como aprendi português, e outras aventuras” do tradutor e intelectual húngaro-brasileiro  Paulo Rónai, o que me levou a refletir sobre minha própria experiência de aprendizagem do português.

Primeiro contato

Minha língua materna é o espanhol, nasci na Espanha em 1974, e aos 5 anos de idade fui morar no Paraguai. Três anos mais tarde, em 1983, vim com minha família para Foz do Iguaçu, no Brasil, e logo entrei na quinta série sem saber falar o português, aprendi "na marra"... observando, escutando, falando, errando, arriscando, e sentindo na pele o estranhamento e a desconfiança dos outros diante de alguém que é visto como um invasor, um estranho.

Por isso a importância da tradução: por permitir que pessoas que não compartilham as mesmas experiências culturais possam compreender umas às outras.

Lembro-me bem do encantamento do primeiro contato com a nova língua, da admiração diante de letras como o “cê-cedilha” e de sinais gráficos como o “acento circunflexo” (chapeuzinho) e a “crase”, que não existem no espanhol. Também me lembro do divertimento diante da nasalização do do ditongo "ão" e do sentimento de frustração por não conseguir reproduzir corretamente alguns fonemas como “z”, “j” e “g” (zero, jeito, sujeira, gincana). Meu pai, alemão, nunca conseguiu dominar o português, ele dizia que soava como um zumbido “zum, zum, zum”, provavelmente devido à abundância dos fonemas fricativos. Outra coisa que chamava a atenção dele era o uso abundante de diminutivos, uma característica marcante da afetividade do brasileiro.

Meu sentimento inicial diante do português foi de encantamento. Qual não foi minha surpresa ao saber que meu nome, Diana, pronunciava-se diferente no Brasil, com o 'd' africado e o 'a' nasalizado /Dziãna/. E a dificuldade ao distinguir a pronúncia das vogais “e” e “o” abertas e fechadas? Quantas vezes ouvi risadinhas quando eu pronunciava fechada a vogal que deveria ser aberta (“janêla”, “atlêta”, “canêla”,etc.), ou quando ao contrário, eu pronunciava aberta a vogal que deveria ser fechada (“clóro”, “ caróço”, “póvo”, etc.)? Que difícil!!! 

Também ocorreram muitas situações engraçadas e constrangedoras com os famosos "falsos amigos" e com o "aprendizado por dedução". Uma das primeiras palavras que aprendi ao chegar ao Brasil foi "prato"; e eu, com toda minha ingenuidade pueril, pensei "Que fácil, se "plato"é "prato", então "planta" é "pranta", é só trocar o 'l' pelo 'r'!" E assim, saí correndo toda contente para convidar minha vizinha para andar de "bicicreta"...

Do encantamento inicial, passei a sentir certa decepção por não compreender todas as palavras, apesar de meu vocabulário aumentar todos os dias, ainda havia tantas e tantas palavras totalmente desconhecidas e misteriosas para mim. Quantas vezes me faltou a palavra adequada para expressar meus sentimentos?

Demorei muito para ficar razoavelmente satisfeita com meu nível de proficiência, sempre fui muito exigente e curiosa e acho que essas duas características me ajudaram muito, pois não deixaram me acomodar.

Aprendizagem formal

Li muito, estudei bastante e fiz três anos completos de Letras Língua Portuguesa, mas não concluí o curso porque casei e, como meu marido é militar do exército, fomos transferidos para o interior do Amazonas, para uma cidade onde então não havia faculdade, Humaitá. Lá trabalhei como professora temporária de espanhol, português e literatura brasileira em dois colégios estaduais, com 11 turmas e cerca de 400 alunos. Uma experiência fascinante que contribuiu muito para meu aprendizado.

Com o crescimento de nossos dois filhos, e na ocasião de nossa terceira transferência, desta vez para Florianópolis, finalmente pude retomar meus estudos. Prestei vestibular novamente e me formei em Letras Língua e Literaturas Espanholas, na UFSC. No início da faculdade, fiz estágio como tradutora numa empresa de tecnologia, que me contratou e onde trabalho até hoje. Após a universidade, cursei uma pós-graduação em Tradução de Espanhol pela UGF. Também fiz o curso “Para Bem Escrever na Língua Portuguesa”, ministrado pelo professor e tradutor Carlos Nougué, um estudo avançado que abordou questões espinhosas da gramática da língua portuguesa, tais como infinitivo flexionado, crase, colocação pronominal, sintaxe de concordância e de regência, vozes verbais, pronomes integrantes e relativos, preposições e conjunções e outras tantas. Sem dúvida, devo muito a este grande mestre.

Aspectos culturais e simbiose

Não queria me estender tanto, o ponto onde eu queria chegar é que, para conhecer intimamente a língua e a cultura de um povo, são necessários muitos anos de convivência e de interação.

A língua é a expressão máxima da cultura de um povo e para mergulhar nesse universo, não basta aprender a gramática, dominar a fonética, a morfologia, a sintaxe, a semântica, os recursos de estilo. É preciso ir além, há que colocar-se na pele do outro e conhecer as características peculiares à sua cultura. 

Para conhecer intimamente o português brasileiro, é preciso conhecer as diversidades regionais, as manifestações artísticas populares, as diversas raças que formaram o povo brasileiro: o índio, o negro, o imigrante e as diversas figuras humanas nacionais e regionais como o sertanejo, o cangaceiro, o gaúcho, o bandeirante, etc. É preciso conhecer a história e a geografia, a literatura, os movimentos intelectuais e artísticos; as crenças, superstições, lendas; o sistema de governo, a legislação e as instituições; os costumes sociais e familiares; os meios de comunicação; os sotaques, as comidas, os esportes, a música, as vestimentas e indumentárias, as religiões, as danças, enfim: conhecer o real e o imaginário de um povo é tarefa para uma vida inteira. Algum dia eu chego lá...

Hoje em dia, acho que ocorreu uma espécie de simbiose entre minha língua materna e o português, as duas vivem juntas e se beneficiam; a segunda foi chegando de mansinho e ocupou o lugar da primeira em meus pensamentos, em meus sonhos e em minhas orações.

sexta-feira, 10 de junho de 2016

Falso amigo: espantoso


Um fato curioso em línguas tão semelhantes como o português e o espanhol é quando um mesmo vocábulo, compartilhado por ambos, adquire sentidos diferentes por razões históricas ou culturais.

Isso ocorre, por exemplo, com o vocábulo “espantoso”. Ambos os idiomas compartilham as mesmas acepções: basicamente, referem-se a algo ou a alguém que causa uma impressão de admiração ou de espanto.

No entanto, enquanto em espanhol, convencionou-se que uma coisa “espantosa” é algo horrível ou terrível; em português lusitano, é algo maravilhoso, extraordinário, impressionante ou genial. Assim, quando alguém diz, em espanhol. que faz um "calor espantoso", quer dizer que faz um calor terrível, insuportável. Ou ainda, quando alguém diz, em espanhol, que assistiu a "una película espantosa", significa que o filme era horrível.

Por outro lado, se um lusitano diz que "a doutora Beltrana de Tal é uma mulher espantosa", trata-se de um elogio, significa que ela é admirável, maravilhosa; por outro lado, o mesmo adjetivo, dito em espanhol, significa horrorosa

Se você procurar por um restaurante ou hotel em Portugal no TripAdvisor, não se surpreenda se encontrar um local com um excelente avaliação, que destaque o "atendimento espantoso". Significa que é maravilhoso, impressionantemente bom. Veja um exemplo aqui.

Veja abaixo um comentário publicado numa página portuguesa sobre a escolha de Emma Watson pelo site AskMen.com, em 2014, como a primeira colocada de uma lista das 99 mulheres mais desejadas por sua beleza e personalidade:

A actriz Emma Watson encabeça a lista das 99 mulheres mais espantosas do mundo elaborada pelo site AskMen.com. A publicação reconhece assim a sua luta pelos direitos das mulheres, especialmente levada a cabo na campanha HeforShe das Nações Unidas.

“Rica, bem sucedida, famosa, com estilo, bonita, inteligente, com personalidade, simpática”, eis como o publisher da AskMen, James Bassil, classifica Emma Watson, justificando assim a sua escolha como a mulher mais espantosa do mundo. (flagra.pt)

Agora, veja o título de uma notícia funesta publicada no site epmundo.com sobre uma mulher que comprou uma geladeira com um cadáver dentro:
Espantoso! Una mujer compra un congelador con un cadáver adentro (sic)" (epmundo.com)

Vejamos mais um exemplo, desta vez, de duas traduções de um trecho do romance The Pale Horse, de Agatha Cristhie. A primeira é uma publicação portuguesa, a seguir, uma versão em espanhol.

“Disse que claro que me lembrava de Miss Grey.
— Uma mulher espantosa. Uma mulher realmente espantosa. Muito talentosa. Ela vai querer algo que a sua esposa tenha usado, uma luva, um lenço, qualquer coisa assim...”

"Le contesté que sí, que, desde luego, la recordaba.
- Una mujer desconcertante, verdaderamente -comentó Bradley-. La naturaleza le ha dado unos poderes excepcionales. La señorita Grey necesitará una prenda personal de su esposa… Un guante, un pañuelo…"
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quarta-feira, 1 de junho de 2016

Como traduzir ao espanhol a palavra "ora"?


"Ora", uma palavrinha com somente três letras nos mostra que a complexidade da tradução não é proporcional à extensão do vocábulo. Muitas vezes, são justamente essas palavras curtas, usadas como bordões, as que dão mais trabalho, por sua abrangência semântica e pelo elemento abstrato e imaginário que carregam. 

A palavra “ora” também possui diversas funções sintáticas: advérbio de tempo, conjunção coordenativa alternativa e interjeição ou partícula expletiva.

Vejamos algumas formas de traduzir esse vocábulo ao espanhol.

1) Como advérbio de tempo, significa agora, neste momento.

O deputado, ora na tribuna votou a favor do processo de impedimento.

Em espanhol:

El diputado, ahora/en este momento en la tribuna votó en favor del impedimento.

2) Como conjunção, serve para ligar palavras ou orações, indicando sequência de discurso ou transição de pensamento (pois bem, entretanto).

Se ele quisesse vir, avisaria; ora, se não avisou, não virá.

Em espanhol:

Si el quisiera venir, vendría; por tanto/así que, si no avisó, no vendrá.

Ainda como conjunção, serve para ligar orações coordenadas com valor alternativo.

O planeta segue uma órbita elíptica: ora se aproxima, ora se afasta do Sol.

Em espanhol também existe a conjunção “ora” com sentido alternativo. Assim como em português, é uma aférese — palavra que resulta da supressão de fonemas — do advérbio “ahora”.

El planeta sigue una órbita elíptica: ora se aproxima, ora se aleja del Sol.

3) Como interjeição e partícula expletiva, exprime impaciência, contrariedade, espanto, dúvida, surpresa. Geralmente aparece em falas e diálogos. Devido à carga afetiva, muitas vezes, é difícil inferir seu sentido. Em conversas, a expressão facial do falante ajuda a nesse processo; em textos, fica mais difícil, precisamos de um bom contexto para interpretar adequadamente o sentido.

Ora/ora essa, de onde vem esse senso de justiça?

Ora/ora bolas, vai amolar outro!

Ora essa, eu é que agradeço!

Ora essa, não faltava mais.

Em espanhol:

Pero bueno/Oye, ¿de dónde viene ese sentido de justicia?

Anda ya/Venga/Caray/Oye, moléstale a otro, déjame en paz.

!Que va/venga, gracias a ti!

Pero bueno/Desde luego, lo que faltaba (no faltaba más).

A palavra “ora” também é usada em locuções como “ora pois” (em vista disso) e “por ora” (por enquanto).

Era um sujeito honesto; ora pois, quem acreditaria que ele se corromperia?

Era un sujeto honesto; ahora bien/por tanto/así que, ¿quién creería que se corrompería?

Por ora, controle sua ansiedade e espere sua vez de falar.

De momento/Por ahora/Por lo pronto, controla tu ansiedad y espera tu turno de hablar.

Em Portugal, utiliza-se a expressão "Ora pois" com o sentido de "com certeza", "claro", "pois então"; nesse sentido, em espanhol, podemos usar "pues claro", "ya lo creo", "como no" (claro), "por supuesto", etc.