Quando pensei em
escrever este texto, procurei inspiração num texto de Ítalo Calvino chamado Por que ler os clássicos, no qual o autor
habilmente consegue despertar a atenção do leitor com a
simples justificativa de que ler os clássicos é melhor do que não ler...
Seguindo essa linha,
eu podia simplesmente dizer que falar duas línguas é melhor que falar uma só,
mas por quê?
Quando aprendi o
português, não aprendi somente um código, um conjunto de palavras e combinações,
aprendi a ver o mundo a partir dos olhos de um brasileiro, conheci um mundo
novo repleto de aventuras e desventuras: navegações, desbravamentos,
miscigenações, revoltas que culminaram num povo autêntico e único. Aprendi a
viver, a pensar, a sonhar como um brasileiro. Conheci um universo de músicas,
ritmos, textos, sabores, sotaques, folclore, paisagens, arte. Enfim: só ganhei! (veja também: Como aprendi o português).
E o mais incrível foi
que, aprendendo sobre a língua portuguesa, aprendi mais sobre a língua espanhola;
aprendendo sobre o Brasil, aprendi mais sobre a Espanha; e aprendendo sobre os
brasileiros, aprendi mais sobre os espanhóis, tudo isso porque só conhecemos a
nós mesmos através dos outros, é a relação com o outro que nos define.
Mas não é minha
intenção fazer filosofia, minha intenção é convidá-los a ampliarem seus mundos.
O Brasil está rodeado de países hispano-falantes dos quais sabemos muito
pouco; fazemos fronteira com dez países e vivemos isolados em nosso mundinho. Como
podemos almejar uma liderança regional ignorando nossos vizinhos? Uma das
principais habilidades do líder é ser um bom comunicador, mas como ter uma boa
comunicação com nossos vizinhos se não estamos interessados em aprender sua
língua?
Não é a lei da
educação que tem que mudar, é a nossa atitude.
Quando cheguei ao
Brasil tive medo, saí de minha zona de conforto. Fui “jogada” na quinta série
sem saber falar português. Eu tinha somente nove anos e me senti mais perdida
que cachorro quando cai do caminhão de mudança, mas aos poucos fui me
arriscando, estabelecendo contato, vencendo meus preconceitos, fui me integrando,
fui me envolvendo e quando vi... Pronto! Eu queria ser brasileira! E o tempo
foi passando, e o meu sonho de ser zoóloga e de poder me comunicar com os
animais acabou substituído pela profissão de tradutora e pelo desafio de me
comunicar com os homens ;-)
A propósito, sabe
aquela expressão de “perdido como cachorro que cai do caminhão de mudança”?
Pois na Espanha se diz “perdido como un turco en la neblina?” a origem dessa expressão é na verdade uma deturpação. Na Espanha, durante
muito tempo, a bebedeira foi vinculada aos turcos, acusados de infiéis e de não serem tocados pela água
benta, daí que o vinho sem adição de água fosse chamado de vino turco. Com o tempo, a expressão tener una
turca passou a ser sinônimo de estar bêbado; e por extensão, turca, passou a significar bebedeira. Então,
imagine um bêbado perdido na neblina...
Você sabia disso? Não?
E sabia que o Brasil pertenceu durante sessenta anos (1580-1640) à Coroa
espanhola, unida à de Portugal no reinado do rei Felipe II? Pois é, a presença
do hispano no Brasil é bem maior do que podemos imaginar...
Vivemos num mundo
globalizado onde língua é cultura, cultura é conhecimento, conhecimento é
poder, e poder é liberdade.
Mas se meus argumentos
não são bons o suficiente, vamos às cifras:
- Em 2015, quase 470 milhões de pessoas tinham
o espanhol como língua materna. Por sua vez, o grupo de usuários potenciais
de espanhol no mundo (grupo de domínio nativo, grupo de competência
limitada e o grupo de aprendizes de língua estrangeira) chegava a quase
559 milhões.
- O espanhol é o segundo idioma
de comunicação internacional.
- É a segunda língua materna do mundo por
número de falantes, atrás do chinês mandarim.
- Mais de 21 milhões de alunos estudam espanhol
como língua estrangeira.
- Nos Estados Unidos, 41 milhões de pessoas falam
espanhol de forma nativa e 11,6 milhões são bilíngues.
- Em países como o Brasil, onde não há
muitos profissionais que falam mais de um idioma, o domínio de outra
língua pode aumentar consideravelmente as chances de emprego e até mesmo o
salário.
Isso sem falar no
acesso ao vasto e inestimável acervo artístico e cultural hispano-americano.
Então, respondendo à
pergunta que abriu este texto: Por que aprender espanhol?
“Por que não encontro
nenhuma boa razão para não aprender!”
Muito Bom!
ResponderExcluirRazões tem um monte, pena que quase a única que impulsa as pessoas para aprender espanhol é ter mais uma competência para colocar no seu Currículo.
Mas concordo plenamente com a reflexão final:
Por que não?
Obrigada, Claudio, acabei de dar uma olhada em sua página e deparei com o "argenchino desenvolvedor", muito engraçado ;-)))
ExcluirGostei!