quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

Reflexões sobre profissões e alguns nomes despectivos em espanhol

Theodoor Rombouts, El charlatán sacamuelas

Recentemente li um artigo de um jornalista, do jornal espanhol ABC, que comentava sobre os modismos relacionados aos nomes das profissões e fazia um elogio aos dentistas que se anunciavam como tais nos classificados do jornal, em lugar de usar os títulos de “odontólogos” ou “estomatólogos” (do grego "stoma", boca). Muitas pessoas acham que “estomatólogos” são os médicos do estômago e não dentistas.

E assim ele continuava o desabafo, dizendo que agora os “consejeros delegados” das empresas são os “CEO”; que os “Jefes de Personal” são os “Directores de Recursos Humanos”; os “Jefes de Prensa”, “Directores de Comunicación”; e os “relaciones públicas”, “Directores de Relaciones Institucionales”.

Aqui no Brasil não é diferente, agora os treinadores são "coach", os corretores são os “agentes ou consultores imobiliários”. Tradutor agora é “consultor de assuntos linguísticos”, pedagogo é “consultor de avaliação em projetos educacionais”, organizador é “consultor de organização de guarda-roupas ou personal organizier”, feirante é “consultor de assuntos hortalísticos”, catador é “consultor de reciclagem” e por aí vai...

Eu fico me perguntando se uma pessoa comum que precisa de um serviço de tradução vai procurar no Google por um tradutor ou por um consultor de assuntos linguísticos? Há outras profissões que são verdadeiros mistérios, os "brokers", por exemplo; nos mercados financeiros, são operadores individuais; no setor de transporte marítimo, intermedeiam fretamentos; numa empresa ou indústria é o indivíduo que cuida das vendas, promoções, marketing, pesquisa de mercado, crédito e cobrança, armazenamento e distribuição, ou seja, é pau para toda obra. Outros que também são faz-tudo 
são os que trabalham no "staff", ou seja, na equipe de apoio, principalmente em eventos, auxiliares que podem executar as mais diversas tarefas, tais como as instalação de som e iluminação, manutenção de equipamentos de informática, cadastramento de participantes, auxílio nas apresentações audiovisuais, cafezinhos, etc. .

Os estabelecimentos também não são mais os mesmos, o açougue agora é “boutique de carne”; o famoso frango assado conhecido como televisão de cachorro virou ”rotisserie”; o salão de cabeleireiro virou “coiffeur”, e os “bota-fora” agora são “outlets”...

Bom, é verdade que não se trata apenas de embelezar o nome das profissões para atribuir-lhes mais importância, o fato é que muitas profissões evoluíram e se aperfeiçoaram juntamente com os nomes, antigamente a moça que fazia as sobrancelhas se limitava a arrancar os pelos com a pinça. Hoje as “designers de sobrancelha” fazem um estudo de sua geometria facial, definindo o formato de sobrancelha ideal para valorizar seu rosto, há cursos específicos para isso. 

Assim como em português temos apelidos pejorativos para os maus profissionais, por exemplo, para advogado, temos “chave de cadeia”, em espanhol, também temos alguns nomes despectivos consagrados para algumas profissões:

Advogados = “picapleitos
Funcionários e administradores = “chupatintas
Médicos = “matasanos
Dentistas = “sacamuelas
Policiais = “maderos
Psicólogos ou psiquiatras = “comecocos ou loqueros
Urólogos = “tocapelotas
Pedreiro = “tapabujeros
Cirurgião = “sacapotras
Trabalhador da pedreira = “picapedrero
Clérigo que se mantém assistindo a enterros = “saltatumbas”.

Antes que digam: não vai falar dos tradutores?

Não conheço um substantivo específico para o mau tradutor em espanhol, mas sim uma famigerada frase em italiano "traduttore, traditore" que significa literalmente "tradutor, traidor", que passa a ideia de tradutor como enganador.

Em espanhol exite também a expressão "trujamán" para referir-se ao ofício do tradutor, intérprete.

A palavra "trujamán" provém do árabe hispânico turguman, que designava um tipo de intérprete que atuava em transações comerciais principalmente na baixa Idade Média (séc. XIV a XV). Tratava-se de uma tradução de improviso com fins comerciais, portanto, suponho que envolvesse algumas artimanhas para superar os obstáculos econômicos e comerciais.

Pesquisando um pouco mais, vi que em "lunfardo" (gíria argentina e uruguaia) existe o termo "trucho" para referir-se a algo de péssima qualidade ou falsificado, que, por sua vez, se originaria do español arcaico "truchimán", que, por sua vez, deriva do árabe "turgumán", do qual já falamos acima, mas desta vez com o sentido despectivo de uma pessoa que assedia e seduz os extrangeiros para ludibriá-los.

Enfim, nenhuma profissão escapa aos preconceitos, assim como aos maus profissionais.

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